Vera Lúcia Menezes de Oliveira e Paiva (UFMG)
Podemos encontrar na homepage
do correio belga[1] a história
do correio postal e a primeira menção à transmissão de mensagem. Segundo o site,
o início do correio tem origem na Grécia quando, em 190 A.C., um general
Ateniense, após vencer o exército do rei da Pérsia, enviou um mensageiro para
comunicar a Vitória aos Atenienses. O mensageiro correu aproximadamente 24
milhas até Atenas, mas segundo a história, morreu de exaustão e apenas
balbuciou “vitória!”, antes de cair morto. Nesse episódio, temos o primeiro
mártir do correio postal e a total falta de mediação de tecnologia. A mensagem
enviada por outrem é mediada por um homem que fica responsável pela reprodução e transmissão do texto. Esta forma de
transmissão requer um mensageiro que pode transmitir a mensagem para uma ou
para muitas pessoas, mas sempre reunidas no mesmo local.
Com o advento da escrita, é marcante a interferência da nova tecnologia na transmissão de mensagens e o desenvolvimento do gênero epistolar, representando um gigantesco avanço no sistema de comunicações. Uma prova incontestável do valor das redes postais são tábuas de argila encontradas em 1886 em Tel El Amarna, que testemunham a correspondência entre os soberanos Amenófis II e III do Egito com os babilônicos no século XV a.C., conforme documenta a História dos Correios no site Mundo da Filatelia[2] Segundo o mesmo texto, pequenas tábuas de cera e, depois, os papiros eram trocados continuamente entre Roma, seus exércitos e os funcionários espalhados nos vastos territórios conquistados.
Durante o
reinado da Rainha Elizabeth Primeira (1558-1603) havia um sistema de estradas
postais. Os mensageiros, ou carteiros, andavam ou à pé ou a cavalo. A operação
envolvia um grande número de cavalos, pois cada estágio era de apenas 10
milhas. Depois desse percurso um cavalo descansado era usado. Na maioria dos
casos os cavalos eram mantidos em estalagens ou albergues.
Originalmente a
maioria da correspondência era enviada pelo governo – freqüentemente questões
militares. Havia menos correspondência privada, pois as pessoas comuns eram
pouco letradas, e a nobreza usava seus próprios empregados para entregar a
correspondência.[4]
Na comunicação telefônica, a interação é, basicamente, de um para um. Avanços na tecnologia permitiram a interação entre grupos de pessoas em lugares diferentes, mas, acredito que esse tipo de interação não foi popularizado devido aos custos e à dificuldade de gerenciamento de uma interação sincrônica sem as devidas pistas de contextualização: movimento corporal, expressão facial e olhar.
A ficção, sempre se antecipando à ciência, previa o avanço da tecnologia de telefonia com a transmissão também da imagem do interlocutor. Experiências de utilização simultânea de vídeo e voz em conversas telefônicas foram bem sucedidas, mas essa tecnologia nunca se popularizou.
Outra forma
de transmissão de mensagem bastante usada, principalmente, para fins
comerciais, é o fax. Apesar de sua invenção ser anterior a do telefone, essa
tecnologia só foi popularizada a partir de 1966, quando a Xerox lançou o
aparelho de fax a ser operado em linha telefônica (Saunders, 2001). A partir do
fax, o homem pode enviar fotos e gráficos, não ficando mais limitado por um
código rígido. O texto pode ou não ser transmitido por seu produtor e
dificilmente corre risco de sofrer alterações. No entanto pode haver falhas na
transmissão, deixando o texto incompleto ou ilegível. Quem produz o texto também pode ser responsável pela transmissão e a
entrega é feita sem a intermediação visível de outras pessoas.
Sintetizando, a transmissão de mensagens iniciou-se de forma oral, com mediação humana, depois vieram os textos escritos (tijolos de argila, tábuas de cera, papiros, e documentos em papel – cartas, bilhetes, memorandos, ofícios, requerimentos). Uma revolução na transmissão de mensagens acontece com o advento do computador e a criação do correio eletrônico.
O termo e-mail (electronic mail) é utilizado, em inglês, para o sistema de transmissão e, por metonímia, para o texto produzido para esse fim. O mesmo termo é ainda utilizado para o endereço eletrônico de cada usuário. Em português nos referimos ao canal como Correio eletrônico e ao texto como mensagem eletrônica, mas o termo e-mail[11] já está tão enraizado em nossa cultura, que optei por mantê-lo.
O e-mail ou
mensagem eletrônica é, geralmente, produzido pela mesma pessoa que a transmite
e o receptor é, quase sempre, o destinatário da mensagem. O envio e a entrega
de mensagens é mediada por um ou mais provedores de Internet e seu tráfego é
determinado pela rede mundial de computadores, mas qualquer que seja a rota
seguida, a entrega é, geralmente, feita
em segundos. Caso haja
incompatibilidades entre os softwares utilizados pelo produtor e receptor,
problemas na legibilidade podem acontecer. As mensagens podem chegar em branco
ou cheia de sinais não decodificáveis.
O e-mail, ou
mensagem eletrônica, surgiu em 1971, quando
Ray Tomlinson enviou a primeira
mensagem de um computador para outro, utilizando o programa SNDMSG que ele
acabara de desenvolver. De fato, ele enviou varias mensagens testes. Segundo
ele As mensagens testes foram
totalmente esquecidas. ... Muito provavelmente, a primeira mensagem foi
QWERTYIOP ou algo semelhante.
(In Campbel, 1998)
Foi também
Tomlinson quem escolheu o símbolo @ para sinalizar a localização do endereço de
cada usuário. Ele trabalhava, e ainda trabalha, para Bolt Beranek and Newman
(BBN), uma companhia que fora contratada, em 1968, pelo Departamento de Defesa
Americana para desenvolver o ARPANET[12].
Segundo Campbel
(1998), após certificar-se que seu programa funcionava, Tomlinson enviou uma
mensagem aos colegas do projeto, narrando o feito e instruindo-os a colocar a
arroba entre o login do usuário e o nome do computador provedor. O
primeiro uso do correio em rede, diz Tomlinson, anunciou sua própria
existência. Além do SNDMSG,
programa para enviar e-mails, Tomlinson também desenvolveu o READMAIL para sua
leitura[13].
A rede se expandiu e, segundo
informações do site da RNP[14],
a Internet chegou ao Brasil em 1988, fruto de ação conjunta do Ministério
da Ciência e Tecnologia, CNPq, da FINEP – Financiadora de Estudos e Projetos,
da FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, da FAPERJ –
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro e da FAPERGS –
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul.
Atualmente, é raro o estudante de uma
instituição de ensino superior que não tenha seu endereço eletrônico e
iniciativas governamentais estão, aos poucos, fazendo com que a Internet, e a conseqüente
interação por e-mail, esteja ao alcance de todos os jovens em idade escolar.
As mensagens
eletrônicas são hoje, possivelmente, o tipo de texto mais produzido nas
sociedades letradas. É oportuno, portanto, refletir sobre a vantagens e
desvantagens desse novo artefato cultural para a transmissão de mensagens:
VANTAGENS
|
DESVANTAGENS
|
Velocidade
na transmissão.
Assincronia. Baixo custo.
Uma mesma mensagem pode ser enviada para milhares de pessoas no mundo inteiro. A mensagem pode ser arquivada,
impressa, re-encaminhada, copiada, re-usada.
As mensagens podem
circular livremente.
As mensagens podem,
geralmente, ser lidas na web, ou baixadas através de um software.
Arquivos em formatos diversos podem ser anexados. Facilita
a colaboração, discussão, e a criação de comunidades discursivas.
O usuário é facilmente contatado. |
Dependência de provedoras de acesso.
Expectativa de feedback imediato.
Acesso discado ainda é muito caro.
O e-mail pode ir para
o endereço errado, ser copiada, alterada.
Há excesso de mensagens irrelevantes.
Mensagens indesejadas circulam
livremente.
Problemas de
incompatibilidade de software pode dificultar ou impedir a leitura.
Arquivos
anexados podem bloquear a transmissão de outras mensagens ou, ainda conter
vírus.Arquivamento ocupa espaço em disco, gerando lentidão da máquina.
O receptor pode ser involuntariamente incluído em fóruns e malas diretas. Há uma certa invasão de privacidade.
|
Como vimos no quadro acima, o correio eletrônico possui várias características positivas, mas há contrapartidas negativas. Se uma marca do novo meio é a velocidade na transmissão, essa por sua vez pode ser prejudicada por problemas nas provedoras, como caixas postais sem espaço, ou mesmo congestionamento no fluxo de mensagens. Veja exemplo abaixo de mensagem recusada devido a caixa postal cheia:
----- The following addresses had permanent fatal
errors -----
<xxxxxxx@zipmail.com.br>
(reason: 552 RCPT TO:<xxxxxxx@zipmail.com.br>
Mailbox disk quota exceeded)
De um modo geral, o custo é baixo se comparado a outras formas de transmissão como o telefone ou o correio convencional, principalmente, se se leva em conta a quantidade e diversidade de dados (texto, imagem e som) que podem ser transmitidos em segundos. No entanto, muitas pessoas dependem de acesso discado que ainda é muito caro no Brasil. Além disso, é preciso pagar uma provedora e os acessos gratuitos, segundo a imprensa, estão com os dias contados.[15]
A assincronia associada à velocidade de transmissão possibilita unir os membros de uma comunidade discursiva dentro do espaço de interação virtual onde cada um lê e produz mensagens na hora que lhe convém. Porém, estudos indicam que o novo gênero cria nos seus usuários uma ansiedade por feedback rápido (Paiva, 2003), gerando uma grande pressão no leitor. Há ainda mecanismos nos softwares de edição e processamento de e-mails que permitem ao autor solicitar ao seu leitor que confirme automaticamente, com um simples clique, o recebimento da mensagem. Ao aceitar a pressão, o leitor, de uma certa forma, se sente na obrigação de responder rapidamente, caso contrário, seu interlocutor saberá que sua mensagem foi lida, mas que a resposta foi protelada.
Uma outra característica relevante do e-mail é a possibilidade de se enviar, ou re-enviar, um mesmo texto para pessoas no mundo inteiro ao mesmo tempo. O envio para vários endereços pode colocar os destinatários vulneráveis, principalmente quando seus endereços não são protegidos por cópia oculta. A velocidade com que as ações são executadas pode, ainda, fazer com que endereços errados sejam escolhidos. Qual de nós nunca recebeu uma mensagem por engano[16]. Além do engano na escolha do endereço, a velocidade e a falta de experiência com o meio faz com que os usuários enviem mensagens repetidas, ou em branco, e se esqueçam de anexar os arquivos que pensam estar encaminhando. O humor, sempre atento, faz circular na Internet uma piada que registra os principais enganos na utilização do correio eletrônico:
Parece que existe um virus chamado Virus
Senil que não pode ser contido mesmo por programas avançados como o Norton. Assim
tome cuidade, pois ele parece afetar aqueles que nasceram antes de 1965!
O Virus Senil faz
com que você
1. envie o mesmo e-mail duas vezes.
2.
envie e-mail em branco.
3.
envie para a pessoa errada.
4.
envie de volta para a mesma pessoa que o enviou a você.
5.
esqueça de atachar os textos.
6.
aperte o "ENVIAR" antes de terminar a mensagem.
Sua mensagem pode ainda ser copiada, alterada, circular livremente e seu nome utilizado sem que você saiba. Se a circulação livre dribla a censura e faz com que protestos e denúncias importantes circulem pelo mundo, ela também contribui para a circulação sem limites de mensagens não solicitadas (spams) e informações falsas (hoaxes).
A velocidade e a possibilidade de leitura on-line (webmail) das mensagens facilita o contato com usuários que, mesmo estando do outro lado do continente, podem continuar em contato com seus interlocutores de forma assíncrona. No caso de longas distâncias e diferenças de fuso horário, por exemplo, o e-mail contorna problemas como o de ter que acordar muito cedo ou deitar mais tarde para poder falar ao telefone com alguém em um horário confortável para o interlocutor. Algumas incompatibilidades de software podem dificultar a interação entre os usuários, mas este não é um problema muito recorrente. Hoje a maioria dos softwares já aceita acentuação, mas ainda podem ocorrer pequenas incompatibilidades e, algumas vezes, recebemos textos incompreensíveis, em branco, cheios de caracteres estranhos, ou com apenas um sinal como o seguinte: ÿþ.
A grande inovação do correio eletrônico é a possibilidade de transmissão de vários tipos de dados: textos diversos (formato texto, power point, tabelas, gráficos) imagem (desenhos, fotos), som (fala e música), e vídeo. Arquivos anexados, no entanto, podem conter vírus, gastar muito tempo para serem descarregados ou, quando muito grandes bloquear a transmissão. O Acúmulo de informações arquivadas pode ocupar muito espaço em disco e gerar lentidão na máquina. O aconselhável seria o arquivamento em CDs.
O correio eletrônico é uma ferramenta que facilita a colaboração, discussão de tópicos de trabalho e aprendizagem em grupos grandes, viabilizando a criação de comunidades discursivas, superando limitações de tempo e de espaço. O problema é que, às vezes, você é incluído, involuntariamente, em fóruns e malas diretas e, nem sempre, conseguirá se safar dessas redes com facilidade.
Apesar de todas essas vantagens, há uma verdadeira invasão de privacidade e a demanda em cima do usuário cresce a cada momento. No caso dos professores, a cada turma que se forma, é comum que pelo menos um ou dois alunos permaneçam em contato constante e o excesso de mensagens e a falta de tempo para gerenciar a caixa postal têm gerado queixas freqüente por parte de muitos usuários.
Bem antes da popularização do e-mail, McLuhan (1972), na década de 60, cunhara o termo “aldeia global” em decorrência das transformações geradas pela mídia eletrônica e a conseqüente “recriação” do mundo. Agora transformado em uma aldeia em função da velocidade e da simultaneidade, o mundo se conecta de forma multimídia e multisensorial e as distâncias entre os homens vão se reduzindo. Sua afirmação de que “o meio é a mensagem” nunca foi tão verdadeira. De fato, no caso do correio eletrônico, não é a mensagem que transforma o homem, mas o meio. O surgimento do correio eletrônico dividiu a sociedade entre os “com internet” e os “sem internet” e o endereço eletrônico passou a fazer parte dos dados pessoais de qualquer cidadão com maior inserção social. Seu uso mudou os hábitos interacionais, ampliou o acesso rápido a conhecidos e desconhecidos, diminuiu o uso do correio tradicional e aumentou a invasão de privacidade, tal o volume de correspondências indesejadas, na maioria das vezes, de gosto duvidoso.
E-mail:
um novo gênero textual
O e-mail é gênero ou canal? Pelo correio eletrônico circulam vários gêneros (ofício, abaixo-assinado, receitas culinárias, propaganda), mas defendo que existe um gênero específico associado a esse novo artefato.
Indícios
importantes para o novo gênero são citados por Campbel (1998)
Em trabalho publicado em 1978 pelo
Institute of Electrical and Electronic Engineers, duas figuras importantes na
criação da ARPANET, J. C. R. Licklider e Albert Vezza, explicaram a
popularidade do e-mail. "Uma das vantagens do sistema de mensagens em
relação à carta é que, em uma mensagem ARPANET, você poderia escrever
concisamente e digitar com imperfeições, mesmo se dirigindo a alguém mais velho
ou em posição superior, e, até mesmo, para uma pessoa que você não conhece, e o
destinatário não vai se sentir ofendido....Entre as vantagens do sistema de
mensagem em rede sobre o telefone é poder ir direto no assunto sem uma conversa
preliminar, o fato de poder armazenar os textos, e de o emissor e receptor não
terem que estar disponíveis no mesmo momento”.
A informalidade,
a inobservância de algumas regras ortográficas, a objetividade, e a ausência de
pré-seqüências são algumas características do gênero percebidas pelos
cientistas citados acima.
O e-mail, ou mensagem eletrônica, segundo Gannon-Leary (1989:2),
Tomando como base a definição de pragmática de Crystal[18] (1985:240), entendo a competência pragmática como a habilidade para fazer escolhas adequadas e observar restrições na interação social de forma a se comunicar de forma efetiva e bem sucedida. O usuário com competência pragmática, além de usar a língua de forma adequada ao contexto (competência sociolingüística), seleciona e utiliza seus atos de fala, silêncios e emoticons de forma a produzir sentido e estimular a interação (competência ilocucional). A competência pragmática, em síntese, significa saber interagir, conviver.
A competência tecnológica é o saber fazer, saber manipular os softwares de produção e gerenciamento de e-mail, tirando o melhor proveito possível de todas as ferramentas disponíveis: mecanismos de edição (copiar, colar, deletar informações irrelevantes de mensagem anterior, usar o corretor ortográfico), customização (opção de formulários e planos de fundo, tamanhos e tipos de fontes, assinatura automática, seleção de idioma), gerenciamento (organização de arquivos de endereços e de mensagens, utilização de sinalizações de acompanhamento, exclusão automática de mensagens indesejadas), e configurações de teclado.
Quanto à competência intercultural, a partir da definição[19] de Byram (1997), citada por Tolbert (2003), entendo a competência intercultural como a capacidade de interagir com pessoas de outra cultura em língua estrangeira procurando formas de interação que não gerem constrangimentos e nem agridam ao interlocutor e que, ao mesmo tempo não representem danos a identidade do enunciador.
A competência intercultural é
especialmente relevante nas interações por e-mail em listas de discussão onde
participam pessoas de várias nacionalidades. Um exemplo que pode ilustrar essa
questão diz respeito aos fechamentos. Enquanto em português, o fechamento
“abraço” pode ser usado até entre interlocutores com pouca familiaridade, em
inglês a palavra “hugs” soaria bastante íntima e invasiva.
E-mail e contexto
Noblia
(1998) ressata que
Como a comunicação mediada por computador é uma comunicação baseada em textos, ao contrário da comunicação face a face, sofre a ausência de indicadores não-verbais (gestos, expressões, olhares, entonação, acento, etc.) que normalmente ocorrem quando todos os participantes estão presentes no mesmo ambiente físico. Um paliativo para essa ausência é a “paralinguagem eletrônica” que oferece aos interlocutores os chamados “emoticons” (que tentam reproduzir sentimentos, emoções, risos, etc. através uma combinação de símbolos). Mas, na verdade, é apenas um paliativo e, a comunicação, especialmente se for sincrônica (on line), tem a vantagem se ser interativa enquanto a ausência de ambiente físico e a impossibilidade de acontecer face-a-face constituem suas desvantagens.
Nas
disciplinas que ministro utilizando a interação por e-mail, não são raros os
depoimentos de alunos que, espontaneamente, refletem sobre a interação online.
Alguns se ressentem da ausência da interação face a face ou da ausência de
contexto. Vejam alguns depoimentos
(1)
O fato de não conhecer ninguém, além de não estar presente, vendo as pessoas,
trocando idéias pessoalmente, me deixou sem referencial.
(2)
It´s very interesting because I read several e-mails, learn with them, find out
about new adress and day after day meet more people... I would like to know my
colleagues. Is This possible?
(4).... Estou
achando muito interessante este curso online...... interessante e diferente...
Diferente porque durante todos estes anos como aluno, o contato que temos em
sala de aula e de corpo a corpo, face a face , nos faz usufruir de outros
recursos de comunicação que não acontecem neste universo on-line. Contudo, o
meu proveito aqui não se resume somente aos comentários e os textos lidos, mas
também no comportamento de todos nós, participantes virtuais deste grupo de
estudo.
(5) e observo,
entre outras, uma diferença na discussão on-line que estou sentindo na pele: a
interação face a face tem um caráter mais intimista, e por ser assim torna-se
mais fácil por ter respostas imediatas, etc, etc.. Por outro lado, a interação
on-line também tem uma série de vantagens: pensamos mais, reformulamos
questões, etc.
A falta de contexto (a ausência física do
interlocutor balançando a cabeça, acompanhando o olhar ou ouvindo pistas de
retorno de canal ou backchannels) gera
um certo desconforto em alguns usuários e a velocidade na transmissão do e-mail
parece ser o motor do sentimento de urgência gerado pelo novo gênero. Há,
geralmente, uma forte ansiedade por feedback o que representa uma pressão no
usuário para agir rápido e responder às mensagens, pois o silêncio nesse
contexto é um poderoso feedback negativo que pode desestimular a interação e
causar o abandono de fóruns de discussão ou, mesmo, cursos a distância.
Para que a interação por e-mail seja bem sucedida, é necessário que o usuário da rede obedeça a algumas normas de interação. A bolsista de iniciação científica Rafaela Gonzaga de Oliveira comparou as normas apresentadas em 10 sites (vide endereços em apêndice) sobre netiquetas para e-mails e listas de discussão.
Após
comparar as listas, a bolsista montou uma nova lista incluindo as regras mais recorrentes e, portanto,
consideradas mais importantes para um bom comportamento interacional no convívio
virtual na Internet. São elas:
1.
Evitar escrever a
mensagem inteira em caixa alta. Letras maiúsculas indicam que se está gritando,
ou enfatizando algum termo ou expressão.
2.
Sempre especificar o
assunto da mensagem no assunto/subject.
Ajuda o destinatário a selecionar criteriosamente as mensagens a serem lidas.
3.
Seja claro, breve e
objetivo. Evite erros gramaticais, e evite mandar mensagens muito grandes.
4.
Diversos programas de
e-mails não são compatíveis com os caracteres acentuados da língua portuguesa,
muitas vezes sendo impossível de se ler a mensagem enviada, portanto evitar
acentuação.
5.
Não mandar e-mails não
solicitados: correntes, avisos de vírus, propagandas, etc, pois elas geram
trafego inútil na rede.
6.
Assinaturas em e-mails
são interessantes, desde que não sejam muito longas. Aconselha-se não adicionar
telefones pessoais, nem endereços.
7.
Usar os smileys (ícones que denotam emoções) como tentativa de
demonstrar mais claramente o tom de sua mensagem, na internet não se é
interpretado como se o fosse frente a frente conversando com alguém.
8.
Evitar flames (brigas),
nem enviar ou responder a material provocativo. Nunca ofender, xingar ou gritar
com alguém, ser conservador com o que escreve e liberal com o que recebe.
9. Ao responder a um e-mail, apagar as linhas da mensagem recebida, deixando somente as partes essenciais da mensagem referenciada.
10.
Antes de fazer alguma pergunta ou enviar alguma
mensagem para a lista, observar a discussão.
Não enviar mensagens que nada acrescentam ao tema da lista.
11.
Evitar mandar mensagens fora do tópico da lista. Algo
mandado que não tenha a ver com o tema escrever no subject: OT (off
topic).
12.
Não mandar arquivos anexados para uma lista de
discussão, ou quando o destinatário não o solicitou.
13.
Evitar cross-posting, mensagens enviadas para diversas listas. A maioria delas não aceita
esse tipo de atitude.
14.
Procurar ler sempre os FAQ’s, respostas às suas
perguntas podem estar respondidas. Leia o FAQ para saber o que se pode ser
discutido, e quais são os tipos de mensagens indesejáveis.
15.
Respostas individuais devem ser mandadas diretamente
para o destinatário e não para a lista inteira.
We would need you as a Foreigner acting
as the next of kin and sole benefactor to the inheritance of Mrs. Ann Barbara
Myers to travel and claim this money in a SECURITY COMPANY based in Europe
which is used by my bank as an offshore payment center to the bank. The money
will be paid to you for us to share in the ratio of 60% for me and 40% for you.
There is no risk at
all as all the paperwork for this transaction will be done by the Attorney and my position as
the head of the accounts/operations dept guarantees the successful execution of
this transaction.
Se o leitor aceita a proposta de mediar a retirada do dinheiro de um banco no exterior, ele vai ter que adiantar algum dinheiro para as taxas e, na tentativa de ficar rico de forma fácil, acabará perdendo um bom dinheiro.
Uma lista dos scams mais comuns, com descrições detalhadas, pode ser vista no site Top Tem Dot Com[24].
Os hoaxes são mensagens que têm por objetivo enganar ou ludibriar o leitor e se assemelham aos trotes e mitos urbanos. O exemplo mais comum é o falso alerta contra vírus de computador. Segundo o site Stiller Research[25], uma mensagem hoax inicia-se com palavras em letras maiúsculas no título e te avisa sobre o perigo de se abrirem e-mails com determinados títulos. Veja exemplo:
VIRUS WARNING !!!!!!
If you receive an email titled "WIN A HOLIDAY" DO NOT open it.
Outros exemplos são: falsa morte de celebridades e pedidos de ajuda. Gabriel Garcia Marques já teve sua pretensa morte anunciada na lista de notícias de Mark Warschauer[26](que se desculpou em seguida ao descobrir que fora enganado) e circula na Internet um poema/carta despedida do escritor, que, realmente, sofre de câncer, mas não produziu tal texto. Outro hoax famoso é a corrente sobre uma criança que sofre de câncer. O autor pede que repassemos a mensagem para a Sociedade Americana do Câncer e que, supostamente, receberia 3 centavos a cada mensagem recebida. Várias versões desse texto circulam pela Internet.
Spams, scams e hoaxes são variações de gêneros que já circulavam antes da existência da Internet. As propagandas por malas diretas sempre encheram nossas caixas de correio; incautos sempre caíram no discurso persuasivo do conto do vigário e acreditaram em trotes e mitos urbanos se encarregando de repassar as narrativas para frente. Com as novas tecnologias, esses tipos de texto ganharam maior circulação e efeito perlocucionário mais poderoso. Quando recebemos uma mensagem pedindo ajuda ou alertando contra algum perigo, nossa solidariedade é acionada, e, em conseqüência, repassamos o texto para todos os amigos, contribuindo para o excesso de mensagens e todas as suas conseqüências negativas.
O
correio eletrônico é um novo canal de mediação de gêneros já conhecidos e deu
origem a um novo gênero que agrega características do memorando, do bilhete, da
carta, da conversa face a face e da interação telefônica. Dos textos escritos
herda a assincronia. Do memorando toma de empréstimo semelhanças de forma que é
automaticamente gerada pelo software; do bilhete a informalidade e a
predominância de um ou poucos tópicos; da carta as fórmulas de aberturas e
fechamentos. Dos gêneros orais herda a rapidez, a objetividade e a
possibilidade de se estabelecer um “diálogo”. Da conversa face a face, temos um
formato que guarda alguma semelhança com a tomada de turno e a interação
telefônica, além de limitações contextuais também semelhantes, mas com a
possibilidade de colocar em contato pessoas que se encontram geograficamente
distantes. Os usuários têm a intuição de que estão utilizando um novo gênero
que difere dos mencionados acima, mas que ao mesmo tempo guarda uma certa
semelhança. Para comprovar essa afirmação lustro com um exemplo de meu corpus
onde o autor termina seu texto dizendo “Desculpe pelo tamanho do email ( parece mais uma
carta), mas o assunto merece.”
Na figura abaixo, reproduzo uma tela semelhante ao memorando, gerada pelo Microsoft Outlook.
Na primeira linha, é obrigatório o preenchimento do campo com o endereço digital de um ou mais destinatários; na segunda linha, o usuário pode inserir endereços para onde serão enviadas cópias da mesma mensagem. Outro campo embutido na segunda linha é um espaço para cópias ocultas, ou seja, você pode enviar cópias para outras pessoas sem que o destinatário saiba. Na terceira linha temos o assunto, que segundo Crystal (2001:97) é um elemento crítico na tomada de decisão sobre prioridade de leitura ou até de descarte do texto. Através dos assuntos, podem ser filtradas mensagens indesejadas, utilizando-se ferramentas do próprio gerenciador de e-mails ou de outro programa. Um outra opção é a assinatura do usuário que pode ser inserida automaticamente assim que o autor inicia uma nova mensagem. Na ilustração acima usei apenas meu nome e o endereço de minha homepage, mas outras informações podem ser acopladas. A data é gerada automaticamente pelo software.
A
interação
E-mail (1)
From: "Vera Menezes"
<vlmop@uai.com.br>
Date: Wed Feb 12, 2003 9:37 am
Subject: feedback
Iris,
>Well, first of all, I visited www.stuff.co.nz and
they said that
>they are looking to the international community to
act. They are
>working hard to avoid United Nations Iraq has
agreed it
>unconditionally to overflights by U-2 surveillance
planes, a key
>demand of Un weapons inspectors, Baghdad´s UN
ambassador says.
Which country is this?
I am glad you liked the fables and also because of
your achievements.
Peace,
Vera
E-mail (2)
From: "xxxxxxx"
<xxxxxxx@terra.com.br>
Date: Thu Feb 13, 2003 8:32 am
Subject: Re:[rwufmg] Digest Number 91
Hi Vera, the country is New Zealand,
I am sorry.
Iris
Ao manter o texto anterior, apagar partes e selecionar o local adequado para inserir comentários e perguntas o enunciador escolhe o local de transição relevante, e assume seu turno. Falas do primeiro enunciador podem ser entremeadas com o do segundo, gerando um texto muito semelhante ao diálogo oral.
Vale ressaltar que o processo de leitura das mensagens não é obrigatoriamente linear, pois o leitor pode lê-las por hierarquia cronológica (começando da mais antiga ou da mais nova), por ordem alfabética (começando do A ou do Z) ou por assuntos, também ordenados alfabeticamente.
Conclusão
CRYSTAL, D. Language and the
Internet. Cambridge: Cambridge University Press, 2001.
CRYSTAL, D. (1985). A dictionary
of linguistics and phonetics. 2nd. edition. Oxford: Blackwell.
CAMPELL, T. The first email
message. PreText Magazine. 1998. http://www.pretext.com/mar98/features/story2.htm Acesso em 10 de agosto de 2002.
CHAPMAN,
J. Spams and scams. http://www.familychronicle.com/spamscam.htm
Acesso em 21 de maio de 2003.
LARSEN-FREEMAN, D. Chaos/complexity
science and second language acquisition. In: Applied linguistics.
Oxford: Oxford University Press, v.2, n.18, p.141-165, 1997.
GLASBERGEN, R., In: Randy
Glasbergen's funny pictures. http://membres.lycos.fr/TheWalrus/comp1.gif
(acesso em 12/08/2003)
GRICE,
H. P. Lógica e conversação. In: Fundamentos Metodológicos da Lingüística.
Marcelo DASCAL (Org.) Vol. IV. Campinas, 1982.
LAKOFF, R. The logic of politeness:
minding your p’s and q’s. Papers form the 9th Regional Meeting,
Chicago Linguistics Society, 1973. p. 29-305.
MABEE,
C. Biography of Samuel F. B. Morse, adaptado de seu livro The American
Leonardo, a Life of Samuel F. B. Morse [http://www.morsehistoricsite.org/morse/
morse.html]
MAcLUHAN,
M & FIORE, Q. The medium is the message. New York: Bantam Books,
1967.
MAcLUHAN,
M & FIORE. Guerra e
paz na aldeia global.
Trad. Ivo Pedro de Martins. Rio de Janeiro, Record, 1971.
PAIVA, V.L.M.O. Feedback em ambiente virtual. In: LEFFA, Vilson J. [Org.]. A interação na aprendizagem das línguas.Pelotas:Educat, 2003. p.219-254
SAUNDERS, F. They Invented it
When?The Fax Machine. Discover.vol. 22, n.5. May 2001.
(http://www.discover.com/may_01/breakinvented.html)
TOLBERT, S. Intercultural Competence.
http://www.discover.tased.edu.au/lote/global/IntCompetence/intcomp.htm. Acesso em 08 de Janeiro de 2003.
APÊNDICE
01 - Netiqueta
(http://www.netvale.com.br/NetVale/faq/netiqueta.html)
02 - DICAS DE INTERNET
(http://www.zapnet.com.br/zapnet/netiqueta.html)
03 - Embratel - Saber mais sobre Internet via
Embratel
(http://www.embratel.com.br/internet/tecnologia/aplicacoes/navegacao_netiqueta.html)
04 - MAGNET
(http://www.magnet.com.br/magnet/sputnik/netiqueta1.html)
05 - Rede SACI - Netiqueta regras de etiqueta para a
Internet
(http://www.saci.org.br/usuarios/netiqueta.html)
06 - Netiqueta
(http://thecore.com.br/macan/curso/netiqueta.html)
07 - Netiqueta
(http://www.mulhernatural.com.br/netiqueta.htm)
08 - Zapnet - Suporte -- Serviços
(http://www.zapnet.com.br/zapnet/netiqueta.html)
09 - Netiqueta, regras de boa convivência na Internet
(http://www.infodicas.net/artigo_003.htm)
10- Mensagem aos assinantes da
Linux-br(http://linux-br.conectiva.com.br/regras.php3)
[1] [http://pv.en.bpg.post.be/EN/private/%5C/our_company/wereld_post/history/default. asp] acesso em 10 de agosto de 2002.
[2] [http://www.geocities.com/mundodafilatelia/Histcorr/corranti/ corranti.htm] acesso em 10 de agosto de 2002.
[3] [http://homepages.ihug.co.nz/~awoodley/Letter.html] acesso em 10 de agosto de 2002.
[4]Essa
e todas as outras traduções são de minha responsabilidade.
[5] Curiosamente, o correio eletrônico tem trajetória semelhante. Criado para assuntos militares para defesa do estado, teve seu acesso democratizado e popularizado à semelhança do correio postal. Há também uma relação na estrutura de transmissão, pois o correio eletrônico também depende de pontos de transmissão os POPs (Post Office Protocol), ou servidores de e-mail, que recebem e retransmitem as mensagens através de redes (backbones) interconectadas que compõem a infovia mundial.
[6] O correio eletrônico tem trajetória semelhante, começou no governo, se estendeu às universidades, às pessoas de bom poder aquisitivo e encontra-se, no momento em fase de democratização com várias iniciativas de tornar o acesso público possível às camadas de baixa renda.
[7] [http://www.morsehistoricsite.org] acesso em 10 de agosto de 2002.
[8] O que Deus aprontou? (tradução de Carlos Alberto Gohn).
[9] A mesma ordem sofreu o correio eletrônico, primeiro por texto e, agora, já disponível em voz.
[10] [http://www.loc.gov/exhibits/treasures/trr002.html] acesso em 10 de agosto de 2002.
[11] Utilizarei e-mail para a mensagem e Correio Eletrônico para o meio.
[12] ARPANET = Advanced Research
Projects Agency Network .
[13] Mais informações podem ser obtidas em [http://livinginternet.com/?e/ei.htm] acesso em 10 de agosto de 2002.
[14] [http://www.rnp.br/rnp/rnp-historico.html] acesso em 10 de agosto de 2002.
[15] Dez dos 11 provedores de acesso gratuito surgidos entre o final de 1999 e o início de 2000 fecharam as portas, com pesados prejuízos. O próprio iG, segundo a Abranet, teria apresentado prejuízo de US$ 70 milhões em 2000. http://noticias.uol.com.br/mundodigital/ultimas/ult1345u5.jhtm, acesso em 26/12/2002.
[16] São freqüentes, também. Os enganos nas ligações telefônicas. A diferença é que, quando se comete um engano na utilização do e-mail, o texto é repassado integralmente para o receptor errado. Enganos semelhantes acontecem com o fax, mas a freqüência é bem menor.
[17] Emoticons ou smileys são “carinhas” produzidas a partir de caracteres (ex. :) ou J ) e utilizadas para expressar emoções.
[18] “O estudo da lingua do ponto de vista dos usuários, em especial as escolhas feitas, as restrições encontradas ao usar a língua em interação social e o efeito de seu uso sobre outros participantes em um ato de comunicação” (Crystal 1985, p. 240).
[19] Intercultural Competence is being
able to interact with people from another country and culture in a foreign
language - being able to negotiate a mode of communication and interaction
which is satisfactory to oneself and the other interlocutors. Knowledge of the
other culture is linked to language competence through the ability to use
language appropriately and having an awareness of the specific meanings, values
and connotations of language. In: Byram, M.Teaching and Assessing
Intercultural Communicative Competence. Multilingual Matters, Sydney. 1997
[20]
Jeffrey K. Belk é vice-presidente da Qualcom Eudora que desenvolveu um software
para monitorar os flames. [http://www.wired.com/news/technology/0,1282,38723,00.
html].
[21]
[http://groups.yahoo.com/group/CVL/]
[22]
[http://www.howstuffworks.com/news-item229.htm].
[23] Várias versões podem ser encontradas no endereço [http://www.truthorfiction.com/rumors/ nigeriascams.htm]
[24] http://www.ftc.gov/bcp/conline/edcams/dotcon/?NetServe
[25] http://www.stiller.com/holiday.htm
[26] Mark Warschauer é um dos nomes mais famosos na área de aprendizagem de línguas mediada por computador.
[27] A TESL-L , fundada e coordenada por Anthea Tillyer (CUNY), em 1991, é a maior e mais antiga lista de discussão da Internet. Segundo dados da própria lista, em outubro de 2000, eram 27.749 membros em 159 países com uma média de 10 mensagens por dia, com variações em determinados períodos.