Narrativas coletadas por Liliane Sade
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Aprendiz 13:
(sexo feminino – 9o período de Letras)
Lembro de nossas brincadeiras de criança, nos deliciávamos em "enrolar a língua" e dizer que estávamos falando Inglês. E, em nosso mundo de fantasias, acreditávamos que aquelas pessoas que passavam ali por perto e nos ouviam se convencessem de que estávamos realmente a falar inglês. Mas não tinha prazer melhor do que aquele. Eram brincadeiras de criança e que desde cedo traziam implícita a minha vontade em aprender a falar uma língua estrangeira.
Comecei a ter inglês na escola aos sete ou oito anos, mas nunca o assimilei com a idéia de que estava aprendendo a falar uma língua estrangeira, porque na verdade eu realmente não o estava. Foi da primeira série do ensino fundamental ao último ano do ensino médio estudando inglês para ir bem na prova e, posteriormente, para passar no vestibular... Naquelas clássicas perguntas que os adultos nos faziam - "Qual a matéria de que você mais gosta?" ou "Qual a matéria de que você menos gosta?" – a resposta da primeira era Português e a resposta da segunda era Inglês.... Tinha algo de errado nisso, não? Como gostar e desgostar tanto de duas disciplinas que faziam parte de uma mesma área de conhecimento – Linguagem.
Sei apenas que meu ódio pelo Inglês crescia gradativamente ás séries que passavam e estudar para a prova de Inglês do dia seguinte era quase que um martírio. Decorar preposições para na hora da prova não saber aplicá-las... Decorava então logo as frases que, por promessa da professora, iriam cair na prova.... Listas de verbos, vocabulários imensos...
A minha história com o Inglês começou a mudar somente no terceiro ano do ensino médio. A escola ofereceu Espanhol e eu, para fugir do Inglês, desejei trocar a minha opção de língua estrangeira. Mas foi em vão, porque meus pais exigiram que eu continuasse com o Inglês e, o que era pior, determinaram também que eu "optasse" em ficar na turma de Inglês mais avançada da escola. E nada de português em sala de aula, tudo em Inglês... eu ficava totalmente á parte da aula... apenas admirava a fluência da professora e dos meus colegas mas sem entender uma palavra que fosse do que estavam dizendo... Sentia-me extremamente perdida e sem a auto-confiança necessária para uma aprendizado.
Minha opção profissional veio a tornar essa história ainda mais relevante em minha vida – eu ia prestar vestibular para Letras e fazer um curso de licenciatura para Língua Portuguesa e Língua Inglesa.... Em cinco anos eu seria professora de Inglês... mas eu não escolhi fazer Letras por causa do Inglês, o Inglês era obrigatório no fluxograma do curso da Universidade que eu tinha escolhido. Passei no vestibular e, como disse, sem saber nada de Inglês...
Primeira aula de Inglês da faculdade... abecedário... nove anos estudando inglês na escola e vim aprender a pronúncia de cada letra em inglês somente na faculdade!!!! E entre tantas outras coisas elementares que só cheguei a ter contato a muito pouco tempo atrás. Percebi, no entanto, que mesmo na faculdade as aulas de Inglês estavam ainda deixando muito a desejar e, por iniciativa própria, procurei um cursinho particular de línguas e iniciei um curso de Inglês. Por dois anos o freqüentei e foram exatamente esses dois anos que me empurraram para um envolvimento maior com a língua e que me fizeram acreditar que um dia eu poderia realizar aquele sonho de criança e não só admirar a fluência dos que já estudaram Inglês.
Enfim, estou no último ano do curso de Letras... comecei aprender Inglês efetivamente a apenas quatro anos e, ano que vem, eu teoricamente já vou estar licenciada em Língua Inglesa.... contraditório... mas no papel será assim. Tenho que reconhecer que hoje gosto do Inglês... e domino parcialmente algumas habilidades e o que é mais importante, que desmistifiquei aquele bloqueio que desde a escola me impediam um envolvimento com o meu aprendizado. Tenho que reconhecer também, no entanto, que estou bem longe de ser uma professora da Língua, mesmo às portas de um diploma que irá me conferir tal habilitação. O que importa, porém, é que tive a oportunidade de reverter um processo escolar que pode ter sido meio que traumático no que diz respeito ao aprendizado de uma língua estrangeira – o que nem todo mundo com uma história semelhante a minha pode ter tido.